domingo, 30 de dezembro de 2007

Imaginário revisitado...


Esta é uma obra que faz parte do meu imaginário, e sempre dele fará.


Despeço-me de 2007 indo reviver um dos grandes êxitos de sempre, e uma das minhas eternas paixões, Jesus Christ Superstar, agora em versão portuguesa encenada por Filipe La Féria.

Em Portugal existe um preconceito em relação aos musicais, que são catalogados, por muitos, como espectáculos populares, logo, uma espécie de arte menor. E como em Portugal "musical" é sinónimo de La Féria, este "apanha por tabela". Apesar de já ter visto alguns dos seus espectáculos, confesso que nem todos os que produz me suscitam interesse, o que me tem feito falhar uns quantos. Mas, ainda assim, reconheço o seu mérito. Não que eu tenha tirado o dia para defender La Féria, mas só lamento que quem é sempre tão crítico em relação a musicais não perca um, desde que esteja de passagem por Londres ou Nova Iorque. Talvez porque faça parte do roteiro...

Estou a escrever este post "a quente", acabada de sair do teatro, e nem sequer li as críticas sobre a peça. Mas, em minha opinião, este é talvez o seu melhor espectáculo. Bastante colado à versão original, que Tim Rice e Andrew Lloyd Webber estrearam em Nova Iorque em 1973, este Jesus Cristo Superstar conta com um elenco de 54 actores, cantores e bailarinos. O espectáculo a que assisti tinha Gonçalo Salgueiro no papel de Jesus de Nazaré e Laura Rodrigues em Maria Madalena. Mas é Pedro Bargado, em Judas Iscariotes, que concentra todas as atenções, não só porque é ele o narrador da história - tal como no original - , mas, e sobretudo, pelo magnífico desempenho, tanto como actor, bailarino ou cantor.


Em Jesus Christ Superstar existem múltiplas referências contemporâneas, o que garantiu a intemporalidade da obra. São disso exemplo (a par da música de eleição!) a caracterização das personagens - ora à época, ora actuais - , e todo um conjunto de adereços e de referências típicas dos anos 70. Ora esta versão portuguesa também ela pretende aludir a aspectos contemporâneos, como, por exemplo, o ataque às torres gémeas, de 2001, logo no início do espectáculo.

A peça que acabei de ver em nada desmereceu o original de 1973, mantendo sempre uma intensidade dramática muito grande. O meu mais sincero aplauso!

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

A morte saiu à rua...


T. irrompe pela sala: "Já sabes que mataram Benazir Bhutto?..."

Não sabia. Foi há pouco, hoje mesmo. Fiquei chocada, até - e digo "até", porque já deveria estar mais habituada ao rol de desgraças e consequentes rios de sangue que daquela parte do globo nos reportam, diariamente. Mas nunca nos habituamos realmente, não é assim? Principalmente quando se trata de actores importantes, com papéis-chave na cena política, ou outra. Actores nos quais alguém - muitos, mesmo - depositam esperança num amanhã melhor, mais claro, mais transparente.

Benazir pertencia a uma família de elite, abastada, culta e esclarecida. Interveniente, portanto. Tanto, que é amaldiçoada por um país - e citando Cara Ferreira Alves na sua Pluma Capichosa, em Atenção ao Paquistão (Expresso, 21.08.2007) "(...) [país] onde a única lealdade é para com Deus ou o clã". O Paquistão nunca teve uma identidade nacional e colectiva". O seu pai, Ali Bhutto, fundador do Partido do Povo Paquistanês, (partido de base islâmica mas adepto da democracia ocidental), presidente e primeiro-ministro do Paquistão nos anos 70, foi morto pela ditadura militar que se lhe seguiu. Murtaza Bhutto, irmão de Benazir, activista catalogado com a esquerda paquistanesa (seja lá o que isso for...), foi também ele assassinado, em 1996, durante confrontos com a polícia.

Tal como na Índia - primeiro com Gandhi, em 1947, depois com Indira Gandhi, em 1984 -, ou em Israel, com Yitzchak Rabin, em 1995; todos pacifistas ou defensores de uma maior abertura para os seus países, e todos assassinados por extremistas -, também Benazir foi eliminada, afastada da corrida às próximas eleições de 8 de Janeiro - daqui a dias. Esperança, uma vez mais, adiada.

A morte saiu à rua... ou será que ainda de lá não saiu?...

Percurso de Benazir Bhutto
Nascida a 21 de Junho de 1953, filha do antigo primeiro-ministro Zulfikar Ali Bhutto, Benazir estudou nos Estados Unidos, em Harvard, e obteve um doutoramento em Filosofia, em Oxford.

Benazir regressou ao Paquistão em 1977 quando o seu pai foi afastado do poder pelo general Zia ul-Haq, antes de ser executado pelo regime militar deste último.

Detida várias vezes ou colocada em prisão domiciliária, Benazir reorganizou o Partido do Povo Paquistanês, fundado pelo seu pai.

Exilada em Janeiro de 1984 em Londres, Bhutto fez um regresso triunfal em 1986. De novo detida dias depois de uma manifestação ilegal contra o general Zia, Bhutto escapou a um atentado em Janeiro de 1987. Em Novembro de 1988, o PPP vencia as eleições e Bhutto tornou-se chefe de governo.

Destituída em Agosto de 1990 por corrupção e nepotismo, Bhutto compareceu perante os tribunais especiais de Setembro de 1990 a Maio de 1991 por abuso de poder e desvio de fundos públicos, acusações das quais será inocentada em 1994.

Derrotada nas eleições de Outubro de 1990, passou a fazer oposição. Em Outubro de 1993 subia novamente ao poder com a vitória do PPP, antes de ser afastada pelos mesmos motivos no final de 1996.

Benazir Bhutto casou em 1987 com Asif Ali Zardari e tinha três filhos.

(in Publico, 27.12.2007)

segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

Tucker: the man and his dream

Serve este post para repor a verdade dos factos: era este o filme de que eu não recordava o nome e que referi no post anterior, mas alguém já me refrescou a memória!
Filme dirigido por Francis Ford Coppola, em 1988, enaltece o espírito criativo americano e lamenta que, em muitos casos, tal não seja devidamente reconhecido (é universal, não é?!...)
Bem-hajas pela lembrança!...

domingo, 16 de dezembro de 2007

Por portas e travessas...

É Inverno e faz frio. Um frio cinzento, que contrasta com a luz branca e intensa que abençoa esta cidade. Estico o caminho, desvio-me, e dou por mim a percorrer, preguiçosamente, ruas de um bairro que já foi o meu: prédios de três andares, sóbrios - até na sua decadência de entes mal conservados -, de traçado simples mas funcional. Filhos da reforma de Pombal, Homem com uma visão de futuro e um verdadeiro sentido de modernidade, que se reflectiu muito para além do urbanismo. Estadista iluminado que outros obscureceram, por ignorância, mesquinhez, má-fé ou conveniência. Para a História parece ter ficado apenas a fama de um carácter cruel e impiedoso, em detrimento de valores mais elevados, que lhe eram caros e dos quais nós somos beneficiários.

Sou uma urbanita. Vem-me sempre à memória uma frase que nunca esqueci, de um filme visto há muito e cujo título não recordo, em que alguém, perguntando a outro alguém como gostava ele do café, este respondia: "Na cidade"...

Nascida e criada em Lisboa, gosto de me perder nela, percorrer os seus bairros tão diferenciados, as suas ruas, os becos esconsos, esquecidos por detrás das avenidas. São ruas mais ou menos estreitas, com casas cheias de estórias, em que me cruzo com pormenores que vou, aos poucos, (re)descobrindo. Relembro a velha mercearia de esquina do Sr. João, um minhoto anafado e bonacheirão com uma família a condizer, onde, para além do feijão ou do arroz, a vizinhança se abastecia das chamadas telefónicas para a terrinha, que nos finais de 60 permanecia longe, à espera do Verão. Ou a capelista - estranho nome para uma lojinha de linhas e botões, mas em que também as meninas da escola iam comprar lápis de cor... Relembro, enfim, as velhas ruas pacatas e soalheiras e o pequeno jardim da infância, onde se brincava aos "cinco cantinhos" e à "macaca".

Mas para além da revisitação dos velhos lugares, gosto também de descobrir os pequenos pormenores que normalmente nos escapam: um cunhal de um prédio, uma janela, um pátio... Lisboa é particularmente pródiga em dissimular pequenas pérolas que, no dia-a-dia, nos passam despercebidas. É preciso abrandar o passo e apurar a vista, ver para além de olhar e, sobretudo, saborear, com infinito prazer, os pequenos nadas desta cidade antiga.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Deconstructing Johann...

Música e Coros, uma vez mais!

Para quem possa pensar que a música coral é chata e aborrecida, aqui deixo o testemunho do contrário com este vídeo dos KingsSingers. Parodiando a música de Bach, faz-me lembrar um pouco a peça da Companhia Teatral do Chiado, As obras completas de William Shakespeare em 97 minutos, que tanto sucesso tem tido: uma rapsódia satírica de árias e adágios barrocos, desfilando com muito humor e magistralmente interpretada por este Grupo. Chamo a especial atenção para o final inesperado...

Manoel de Oliveira - em vida...


Manoel de Oliveira completa hoje [11 Dezembro 2007] 99 anos

O mais premiado cineasta português de todos os tempos, Manoel de Oliveira, que hoje completa 99 anos, disse à agência Lusa que está determinado a realizar todos os filmes que ainda tem em projecto.
«Continuo enquanto me deixarem e enquanto tiver saúde», disse à Lusa Manoel de Oliveira, garantindo que quer realizar todos os projectos que tem, sem dar prioridade a nenhum em especial.
«Não quero chegar a parte nenhuma, [o cinema] foi só a minha paixão, foi quase que instintivo», afirmou o cineasta.
Manoel de Oliveira escusou-se a falar sobre o seu passado, sublinhando que está concentrado apenas nos planos para o futuro.
«Não olho para os filmes que fiz», frisou.
Manoel de Oliveira nasceu no Porto em 11 de Dezembro de 1908, mas foi registado como se tivesse nascido no dia seguinte.
Com 76 anos de cineasta e 99 de idade, Manoel de Oliveira é o mais velho realizador de cinema do Mundo em actividade e o mais premiado do cinema português.
«Douro, Faina Fluvial» (1931), «Aniki Bobó» (1942), «Benilde ou a Virgem Mãe» (1974), «Amor de Perdição» (1979), «Francisca» (1981), «Le Soulier de Satin» (1985), «Os Canibais» (1988), «Vale Abraão» (1993) e «O Quinto Império» (2004) são alguns dos mais de 40 filmes que realizou.
«Belle Toujours» e «Cristóvão Colombo - O Enigma» (com estreia marcada para 10 de Janeiro) são as obras mais recentes de Manoel de Oliveira, que tem em projecto «O estranho caso de Angélica» e a adaptação para cinema do conto de Eça de Queiroz «Singularidades de uma rapariga loira».
Diário Digital / Lusa
Detentor de um estilo próprio de fazer cinema, que uns amam, outros odeiam (e rejeitam a priori, sem tentarem explorar melhor os seus filmes), Manoel de Oliveira é principalmente reconhecido e amado internacionalmente, num circuito europeu letrado e intelectualizado. Muitas vezes ignorado no seu próprio país ou, melhor dizendo, por um público não muito dado a expressões visuais desta natureza, o cineasta beneficia de uma longevidade e lucidez raras, manifestando uma vitalidade notável. É este "viver pela positiva", com projectos aos 99 anos, que é de louvar e de invejar!
Filmografia de Manoel de Oliveira:
Longas-metragens
2007 - Cristovão Colombo – O Enigma
2006 - Belle Toujours
2005 - Espelho Mágico (filme)
2004 - O Quinto Império - Ontem Como Hoje
2003 - Um Filme Falado
2002 - O Princípio da Incerteza (filme)
2001 - Je Rentre à La Maison
2000 - Palavra e Utopia
1999 - A Carta (filme)
1998 - Inquietude
1997 - Viagem ao Princípio do Mundo
1996 - Party
1995 - O Convento
1993 - Vale Abraão
1992 - O Dia do Desespero
1991 - A Divina Comédia (filme)
1990 - Non, ou a Vâ Glória de Mandar
1988 - Os Canibais
1986 - Mon Cas
1985 - Le Soulier de Satin
1985 - Simpósio Internacional de Escultura em Pedra - Porto
1983 - Lisboa Cultural
1983 - Nice - à propos de Jean Vigo
1982 - Visita ou Memórias e Confissões
1981 - Francisca
1979 - Amor de Perdição (filme)
1974 - Benilde ou a Virgem Mãe
1972 - O Passado e o Presente
1966 - O Pão (documentário)
1965 - As Pinturas do meu irmão Júlio (documentário)
1963 - Acto da Primavera (documentário)
1942 - Aniki-Bobó

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Quem canta seus males espanta...



Complaints Choir of Chicago - Trailer

A queixa, o lamento, o queixume, a lamúria, a resmunguice - tudo isto, muito mais do que o protesto, activo e organizado, fazem parte do dia-a-dia de muita gente, e nós, portugueses, que o digamos, pois neste registo batemos qualquer recorde! Mas já que a queixinha está na ordem do dia, então, por que não fazê-lo de forma animada?

Isto parece uma contradição, é certo. Parece ferir de morte o próprio conceito em causa, já que, se é para resmungar, necessário se torna um rosto a condizer...

Bem, a tradição já não é o que era. Pode ser que já seja do conhecimento de muitos, mas para mim foi novidade: sabiam que existem vários Coros, por esse mundo fora, que decidiram cantar os lamentos de cada um? Nem mais. Ao que descobri, existe o Coro de Helsínquia, outro de Chicago, outro de Birmingham, o de S. Petersburgo, de Randburg... e outros haverá, certamente. Achei a ideia genial e decidi partilhar esta minha nova descoberta. Eu que adoro cantar e que até de um Coro faço parte, nunca me lembraria de tal proeza!...

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Juan Rulfo


Juan Rulfo (1917-1986)

Continuando na senda do fotojornalismo, descobri recentemente este fotógrafo mexicano, também ele escritor, cujo verdadeiro nome era Juan Nepomuceno Carlos Pérez Vizcaíno. Nascido en Sayula, Estado de Jalisco, a 16 de maio de 1917, faleceu em 1986, na Cidade do México.

O povo mexicano aqui retratado neste portfolio, representa um México campesino e indígena, captado pela lente do artista, entre meados da década de 40 e meados da década de 50, do século XX.

Só em 1980 Rulfo acede a expor, pela primeira vez - uma selecção de cerca de 100 fotos, dos milhares que terá tirado. Como relata María Paulína Ortíz, "El mundo que Rulfo busca en sus fotografías es el mismo del que habla en su literatura. Tiene su misma temperatura, sus sombras, sus silencios, su tranquilidad. Tiene su magia y su melancolía. "

Don't come knocking...

Estrela Solitária

Uma farsa, a história de uma família, um «road movie».
Howard Spence já conheceu melhores dias. Quando novo era uma estrela de cinema, principalmente em Westerns. Agora, aos 60 anos, Howard utiliza drogas, álcool e jovens raparigas para evitar a dolorosa verdade: já só lhe restam papéis secundários para interpretar. Após mais uma noite de deboche no seu atrelado, Howard desperta com a desilusão de se ver ainda vivo, sabendo que ninguém sentiria a sua falta caso morresse.
Essa manhã, Howard não está presente no local das filmagens. Vemo-lo a galopar no seu cavalo das filmagens, usando as roupas da sua personagem – estilo cowboy na íntegra. Mas desta vez não há qualquer câmara a filmar. Howard está em fuga, do filme e da sua vida.
Mas Howard, um alcoólico, não se mantém sóbrio durante muito tempo em casa da sua mãe. Uma noite, ele vagueia até à cidade, acaba num casino de segunda e envolve-se numa zaragata. Howard acorda na prisão e a sua mãe paga-lhe a fiança. Depois, ambos têm finalmente uma conversa séria sobre o passado. A mãe lembra-se que há mais de 20 anos uma jovem lhe ligou tentando localizar Howard e que na época se apercebeu que ela estaria grávida. Howard fica chocado com a ideia de ter algures por aí um filho já crescido Esta criança parece ser um raio de esperança, uma possível salvação da sua vida narcisista e sem significado. Ele foge novamente, desta feita para localizar a seu filho.
Em 1900 Butte, Montana era a maior cidade a oeste do Mississipi. Agora, é um local de grande depressão. A baixa de Butte é uma cidade fantasma, difícil de identificar com o local das filmagens, há 25 anos, do filme que catapultou Howard para o estrelato. Muitos casos de uma noite tiveram lugar na vida de Howard durante essa rodagem. Doreen foi um deles. Ela continua a trabalhar no mesmo café onde conheceu Howard quando era jovem. Ela tem um filho, Earl, músico e cantor que vive também em Butte.
Howard reencontra Doreen. Ela reage com muita calma ao súbito aparecimento do seu antigo amante e pai do seu filho. O encontro de Howard com Earl, por outro lado, é muito violento. Earl rejeita absolutamente o pai que até então desconhecia e que aparece na sua vida demasiado tarde. Entristecido por este encontro, Howard está prestes a desistir e de novo deixar Butte, quando do nada surge uma jovem mulher chamada Sky. Ela tem exactamente a mesma idade de Earl. Ela é, na realidade, filha de Howard, o produto de outro breve encontro que teve lugar durante a mesma rodagem do mesmo filme. É meia-irmã de Earl. Os irmãos não sabem da existência um do outro. E é então que as verdadeiras complicações da reunião desta família americana começam…

Sob a direcção de Wim Wenders, e com Sam Shepard, Jessica Lange, Tim Roth, Gabriel Mann, Sarah Polley, Fairuza Balk e Eva Marie Saint, o último filme deste cineasta alemão, presentemente em exibição nas salas portuguesas, ficou bastante áquem das minhas expectativas. A parceria Wim Wenders/Sam Shepard do velhinho Paris Texas, ou o Wim Wenders do fabuloso e comovente The Million Dollar Baby não se revê, a meu ver, neste taciturno e arrastado drama da estrela de cinema decadente. Salve-se a sempre extraordinária Jessica Lange e parte da banda sonora do filme.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Pelo olhar de Georges Dussaud...


A Assírio & Alvim editou Crónicas Portuguesas, do fotógrafo francês Georges Dussaud, que teve recentemente uma exposição com o mesmo nome, na Cadeia da Relação do Porto.
Fotografia a preto e branco, com o olhar das gentes e o sentimento de uma ruralidade que Dussaud tem vindo a captar desde os anos 80. Belíssimo!
Deixo aqui a ligação para um portfolio, com estes e outros olhares...


terça-feira, 27 de novembro de 2007

Os Gregos vistos por cá...


É comum dizer-se que a Grécia é o berço da civilização europeia. É, igualmente, comum a ideia de que a Europa é o resultado do desenvolvimento e evolução das cidades-Estado do mar Egeu. Tudo isto foi validado pelo conhecimento histórico de que dispomos.

Servem estas afirmações para introduzir a exposição que visitei nos últimos dias, na Gulbenkian: Os Gregos. Tesouros do Museu Benaki, Atenas.

Para a compreensão dos Gregos é necessário estar-se familiarizado com as suas ruínas e os seus lugares, os seus objectos, as suas formas de vida. Parte do espólio do Museu Benaki, agora em itinerância e que podemos apreciar na Gulbenkian, ajuda-nos a, de uma forma muito sintética, acompanharmos a evolução deste povo, através de exemplos escolhidos como significativos de cada um dos períodos históricos aqui focados, que cobrem cerca de oito mil anos de História. Com o apoio de textos que resumem cada uma das épocas tratadas, seguindo um friso cronológico que vai desde a Idade do Bronze até à independência face ao domínio turco, em 1821, passando pela Idade das Trevas, o Período Arcaico, a Época Clássica, a Helenística, a subjugação aos impérios romano, bizantino e otomano, esta exposição apresenta 157 peças de rara beleza, das quais aqui deixo uma pequeníssima amostra.

A não perder, no Museu da Fundação Calouste Gulbenkian, até ao próximo Dia de Reis.

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

"Que farei com este livro?"




Domingo à tarde. Perante a parca oferta cinematográfica, e a pedido de T., decido-me pelo teatro. A Companhia de Teatro de Almada leva à cena Que fazer com este livro?, de José Saramago e encenação de Joaquim Benite, numa segunda versão da peça, estreada em 1980.
Tendo como mote principal Camões e a publicação de Os Lusíadas, esta peça não se esgota na homenagem esperada. Mais do que fazer jus ao poeta e ao épico, pretende mostrar o século XVI e tudo o que estava em cena, à época: a megalomania de um rei imaturo; a complexidade e a tensão do jogo político e social que se travava em Portugal; a "anunciada" perda da independência nacional.
Camões vê aqui integralmente respeitada a sua dimensão humana. "Um homem de carne e de sentidos", disse ele falando de si próprio.

Saramago, ao escrever esta peça, não a fez com carácter biográfico. Antes se debruça sobre o papel do artista na sociedade: quem dele se serve, quem favoreceu ou contrariou a publicação da sua obra e a quem esta pôde beneficiar. É, pois, uma reflexão sobre jogos de poder.
A intemporalidade é uma nota dominante nesta peça. Torna-se visível de várias formas: a caracterização das personagens - Benite, o encenador, recorre à estratégia de não vestir todas as personagens à época e de recorrer a adereços actuais. Na verdade, só o texto segue uma construção mais aproximada ao português de seiscentos, o que imprime aos diálogos um ritmo próprio, poético e simbólico, de uma sonoridade única.
Que farei com este livro? sublinha a intemporalidade do tema fulcral - a liberdade -, também através da ponte que se estabelece entre o Portugal sebastianista e o do século XX, designadamente o do Estado Novo, através da repressão e da censura da Inquisição, por um lado, e, por exemplo, a das personagens fardadas de guardas republicanos de Salazar.
Paulo Matos como protagonista, à frente de um elenco de 20 actores, com um excelente desempenho; música de Carlos Paredes e texto de Saramago, absolutamente brilhante. No Teatro Municipal de Almada, até dia 21 de Dezembro próximo.

sábado, 24 de novembro de 2007

O eu fora de mim

Fotógrafo: Rui Bento Alves (http://olhares.aeiou.pt)


O dia em que o eu me deixou

foi um dia que não me é fácil recordar. em especial por causa do comportamento inesperado do eu nessa tarde terrível. já há alguns anos que não nos dávamos bem. andávamos sempre magoados um com o outro. mas nesse dia foi demais. o eu disse-me que já estava farto de todas as frases em que o colocava. quando pensava, quando escrevia, quando falava. obrigava-o a fazer o que ele não queria fazer de modo algum. por exemplo, projectar-se num ponto de vista que não era o dele. viver uma dor ou uma alegria que não eram as suas. isso, atirou-me ele à cara, dava à sua existência uma intensidade difícil de suportar. disse-lhe que não percebia o que é que ele queria dizer com isso. e ele continuou, exaltado: como é que é possível viver com a consciência de que sou uma forma a tentar comunicar? não me deixas tranquilo a teu lado. dizes que posso contar contigo, mas nunca sei como nem quando. abandonas-me ao fluxo contínuo da tua imaginação. transformas-me constantemente os desejos. eu queria uma vida mais sólida, com predicados definidos. um ponto de onde te avistasse sempre do mesmo ângulo. já não aguento mais viver contigo . esta foi a última frase que lhe ouvi antes de sair porta fora. não sabia o que pensar ou o que sentir nesse momento. ainda não sei. e é a primeira vez que falo disto sem chorar desde que o eu me deixou.
Manuel Portela

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Homenagem...

A Noite Passada - Sérgio Godinho

A noite passada acordei com o teu beijo
descias o Douro e eu fui esperar-te ao Tejo
vinhas numa barca que não vi passar
corri pela margem até à beira do mar
até que te vi num castelo de areia
cantavas "sou gaivota e fui sereia"
ri-me de ti "então porque não voas?"
e então tu olhaste
depois sorriste
abriste a janela e voaste

A noite passada fui passear no mar
a viola irmã cuidou de me arrastar
chegado ao mar alto abriu-se em dois o mundo
olhei para baixo dormias lá no fundo
faltou-me o pé senti que me afundava
por entre as algas teu cabelo boiava
a lua cheia escureceu nas águas
e então falámos
e então dissemos
aqui vivemos muitos anos

A noite passada um paredão ruiu
pela fresta aberta o meu peito fugiu
estavas do outro lado a tricotar janelas
vias-me em segredo ao debruçar-te nelas
cheguei-me a ti disse baixinho "olá",
toquei-te no ombro e a marca ficou lá
o sol inteiro caiu entre os montes
e então olhaste
depois sorriste
disseste "ainda bem que voltaste"

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Para sempre, Paulo Autran

A 12 de Outubro deste ano, morreu Paulo Autran, considerado o maior actor brasileiro da actualidade.
Deixo aqui um registo da sua maneira única de dizer poesia, neste caso de um grande poeta brasileiro: Carlos Drummond de Andrade.

Poemas da minha vida - II

Poema Enjoadinho - Vinícius de Moraes



Filhos... Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem shampoo
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Piadongas...

João Paulo II recebeu Carolina Salgado. Bento XVI recebeu o casal McCann. É imperioso colocar um Securitas à porta do Vaticano.

Não resisti a partilhá-la. Só agora vi esta do Gato Fedorento!... Eu sei, já estou desactualizada, mas o que querem...

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Minha Pátria é minha Língua...

... e com ela a identidade colectiva de um povo.
Não, não sou Velho do Restelo; uma língua evolui, incorpora novos vocábulos, espelha novas realidades. É certo. Mas interrogo-me se será pelas boas razões que Portugal vai ceder - porque é de cedência que se trata - a alterar a sua escrita. É amplamente reconhecido que este Acordo tende a aproximar a nossa escrita da versão brasileira, apontando como razão de peso o facto do Brasil constituir um mercado muito mais vasto e que, portanto, urge captar.
Mas, seguindo o mesmo raciocínio, não será então de lembrar que o inglês falado no Reino Unido também diverge do inglês falado nos EUA e, apesar do mercado norte-americano também ser muito mais vasto do que o inglês, nem por isso os britânicos abdicaram da sua língua, nem se lançaram para um qualquer acordo ortográfico! Mantêm a sua identidade, bem como os norte-americanos mantêm a deles.
Trata-se, uma vez mais, de uma questão de atitude e de capacidade de afirmação.
A propósito desta questão, deixo aqui a notícia de imprensa sobre a posição da APEL e dos problemas que se perspectivam com a ratificação deste Acordo:
"Editores e livreiros exigem debate sobre acordo ortográfico
A Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, APEL, manifestou hoje «profunda preocupação» pelo recente anúncio oficial de que até ao final do ano será ratificado o Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico e exigiu que se realize «um debate sério» sobre a matéria.
Num comunicado à imprensa, a associação considera «precipitada e estranha a forma como este processo tem sido conduzido».
Lembrando os mais de 15 anos de «quase silêncio» decorridos desde a aprovação do Acordo Ortográfico, a APEL observa que a decisão de ratificar o Protocolo, anunciada recentemente pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, ocorre por «pressão» do Brasil e «sem qualquer discussão pública nem intervenção dos ministérios da Cultura e da Educação e da própria Assembleia da República».
O Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe assinaram este ano o Protocolo Modificativo, tendo sido os três primeiros países da CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa - a fazê-lo.
«É fundamental - declara a APEL - que todos os sectores da sociedade portuguesa, sem excepção, tenham consciência das implicações da eventual assinatura do Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico, quer a nível interno, quer a nível externo».
Na óptica da associação, não há, por um lado, «uma avaliação rigorosa do impacto que tal medida terá na Educação(...)» e, por outro, «numa altura em que Portugal beneficia do sucesso alcançado pelas editoras portuguesas em Angola e Moçambique, essa posição poderá ser posta em causa com a ratificação do Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico».
No caso concreto do impacto da medida na Educação, a APEL precisa que não é «apenas» o ensino da Língua Portuguesa que está em causa, na medida em que «toda a edição escolar e para-escolar, incluindo livros auxiliares de várias disciplinas, gramáticas e dicionários, terá de ser rapidamente actualizada».
Também a edição generalista e os catálogos das bibliotecas serão abrangidos, assim se «destruindo grande parte do esforço desenvolvido pela iniciativa do Plano Nacional de Leitura», adverte o comunicado.
Posição semelhante à da APEL foi tornada pública pela Sociedade Portuguesa de Autores, SPA, que contesta a ratificação do Protocolo sem o «indispensável debate público e institucional sobre a matéria».
Diário Digital / Lusa

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Mariza - Chuva

Mariza - Chuva
Jorge Fernando

As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembranças que doem
Ou fazem sorrir

Há gente que fica na história
da história da gente
e outras de quem nem o nome
lembramos ouvir

São emoções que dão vida
à saudade que trago
Aquelas que tive contigo
e acabei por perder

Há dias que marcam a alma
e a vida da gente
e aquele em que tu me deixaste
não posso esquecer

A chuva molhava-me o rosto
Gelado e cansado
As ruas que a cidade tinha
Já eu percorrera

Ai... meu choro de moça perdida
gritava à cidade
que o fogo do amor sob chuva
há instantes morrera

A chuva ouviu e calou
meu segredo à cidade
E eis que ela bate no vidro
Trazendo a saudade

Lura - Na Ri Na (live)

Em memória a uma viagem a Cabo Verde!

terça-feira, 13 de novembro de 2007

De costas para os outros ou a antítese da urbe

De há uns anos para cá, Portugal tem vindo a aplicar modelos estranhos, geradores de comportamentos igualmente estranhos. São disso exemplo os condomínios fechados e os centros comerciais.
Em ambos os casos, são modelos que contrariam o conceito de urbe, de comunidade, de conjunto, de integração. Por razões que me parecem meramente especulativas, gananciosas, as nossas cidades têm vindo a albergar guetos, que apenas funcionam intramuros e que em nada contribuem para o desenvolvimento sustentado das cidades.
Muito se tem atacado (e bem) os centros comercais, por destruirem o comércio tradicional e por retirarem vida à cidade. Mas esquecemo-nos, por vezes, destes guetos que são os condomínios fechados. É neles que se têm vindo a criar infraestruturas de qualidade, como os espaços verdes, as áreas de lazer, o comércio mais cuidado, a segurança. Contudo, estes núcleos de habitabilidade supostamente privilegiada estão a contribuir para que as cidades percam vida própria, esmoreçam, se acinzentem.
Viver numa redoma, porquê? Será que Portugal é um país com um nível de delinquência tal que empurre os seus cidadãos para dentro destas incubadoras, única possibilidade de sobrevivência? Ou será que é uma pretensão de ascensão social, de diferenciamento, de delimitação do território, de alergia ao próximo?
Seja como for, a criação ou, melhor dizendo, a proliferação destes espaços contraria o conceito de urbanismo: uma cidade planificada, com conforto e bem-estar. À escala humana - solidária.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Poemas da minha vida - I

SONETO DA FIDELIDADE

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei-de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor que tive
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Vinícius de Moraes

domingo, 11 de novembro de 2007

Ler devagar... a oriente

Uma amiga falou-me, entusiasticamente, da nova Ler Devagar, na Fábrica de Braço de Prata, na zona oriental de Lisboa. Fiquei curiosa. Fui espreitar.
Deparei-me com uma livraria - ou devo antes dizer, um espaço multiusos - constituído por 12 salas e 3 ateliês, instalada na antiga fábrica de material de guerra, edifício do início do séc. XX. É um espaço aberto a todas as formas de arte, onde se pode ler, relaxar, jantar, ouvir música, assistir a concertos, exposições, lançamentos de livros, ver filmes... enfim, onde até existe uma sala de comércio justo, para venda de roupas e artigos em segunda mão.
Mas o que me encantou particularmente - para além de tudo o que já disse -, foi saber que tem uma Comunidade de Leitores que, duas vezes por mês, propicia debates sobre um livro ou um filme.
Espaço multifacetado, onde a ideia é estar, permanecer, usufruir, degustar até. Para toda a família, a partir das 18h, dias úteis, e 14h aos fins-de-semana. Até às tantas.

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Da autoria...

Ontem à noite, num seminário dedicado às questões da Tradução, o debate girava em torno da dignificação da actividade de tradutor ou, melhor dizendo, do reconhecimento do tradutor enquanto autor de uma obra. A ideia-chave consiste em que a versão traduzida não reflecte apenas a mudança da língua, mas, sobretudo, intrerpreta o original, reescrevendo a obra para uma língua e uma realidade que não a primeira em que foi escrita - o que envolve o tradutor na autoria do livro.
A este propósito passo a transcrever o excerto de A Solidão Reinventada, de Paul Auster, com tradução de Ana Luísa Faria:
"O Livro da Memória. Livro Nono.
Durante a maior parte da sua vida adulta, ganhou a vida traduzindo livros de outros escritores. Senta-se à secretária a ler o livro em francês, e depois pega na caneta e escreve o mesmo livro em inglês. É o mesmo livro e ao mesmo tempo não é o mesmo livro, e a estranheza desta actividade nunca deixou de o impressionar. Cada livro é uma imagem de solidão. É um objecto tangível que se pode agarrar, poisar, abrir e fechar, e as suas palavras representam muitos meses, senão muitos anos, da solidão de um homem, de forma que a cada palavra lida num livro poderíamos dizer para connosco que nos confrontamos com uma partícula dessa solidão. Um homem sentado num quarto a escrever. Quer o livro fale de solidão, quer de companheirismo, é necessariamente fruto da solidão. A. senta-se no seu quarto para traduzir o livro de outra pessoa, e é como se sentasse na solidão dessa pessoa e a fizesse sua. Mas está claro que isso é impossível. Porque uma vez quebrada, uma vez assumida por outrem, a solidão deixa de ser solidão, para se tornar uma espécie de companheirismo. Ainda que só esteja uma pessoa no quarto, estão lá duas. A. imagina-se como uma espécie de fantasma dessa outra pessoa, que ao mesmo tempo está e não está ali, e cujo livro é e ao mesmo tempo não é o mesmo que ele vai traduzindo. É, pois, possível, diz para consigo, estar e não estar simultaneamente sózinho.
Uma palavra transforma-se noutra palavra, uma coisa transforma-se noutra coisa. Trabalha assim, diz para consigo, do mesmo modo que trabalha a memória. Imagina dentro de si uma imensa Babel. Há um texto, e o texto traduz-se num número infinito de línguas. As frases jorram de dentro dele à velocidade do pensamento, e cada palavra pertence a um idioma diferente, mil línguas que ao mesmo tempo clamam dentro dele, e cujo alarido ressoa através de um labirinto de quartos, corredores e escadarias, com centenas e centenas de andares. Repete uma vez mais. No espaço da memória, tudo é ao mesmo tempo aquilo que é e outra coisa. E ocorre-lhe então que tudo o que está a tentar registar no Livro da Memória, tudo o que até agora escreveu, não é mais que a tradução de um instante ou dois da sua vida - esses instantes que viveu na véspera de Natal de 1979, no seu quarto de Varick Street."
Paul Auster, A Solidão Reinventada, trad. Ana luísa Faria, Venda Nova, Bertrand Editora, 1994, pp. 188-189.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Semana Cultural do Intervalo

Foi em 1969, em Algés, que um grupo de pessoas querendo mostrar que o teatro e a cultura podiam ser o entendimento das coisas, das gentes e da vida, fundaram o 1º Acto Clube de Teatro, sucedendo hoje O Intervalo, não apenas como herdeiro, mas como sendo, de facto, um prolongamento. (Roteiro 30 dias - Oeiras, nº 127 )

Já foi no mês passado, concretamente na semana de 8 a 14 de Outubro, que me deliciei assistindo à já tradicional Semana Cultural deste Grupo de Teatro, que funciona no Auditório Municipal Loudes Norberto, em Linda-a-Velha, e que, a pretexto da comemoração do seu 38º aniversário, proporciona a todos quantos estejam interessados, momentos de festa. Assim, lá actuaram Camané, António Victorino d'Almeida, Sérgio Godinho, Paulo de Carvalho, Agir, Mafalda Sachetti, Fernando Tordo, Rão Kyao e António Maria Cartaxo, num périplo que foi desde o fado até à música clássica. Paralelamente, intervieram: Morais e Castro, Cármen Dolores, Luis Aleluia, Maria do Céu Guerra, Hélder Costa, Correia da Fonseca, Raúl Calado (em homenagem a José Duarte), Baptista Bastos e António Cartaxo.

Para encerrar a Semana, duas peças da Companhia da casa: O Barbeiro de Sevilha e Torga.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

O regresso de Michael Moore



Michael Moore volta à carga e coloca, novamente, os Estados Unidos no banco dos réus. Em Sicko, o mote é o débil sistema de saúde norte-americano, que o realizador compara com o de outros países, chegando mesmo a levar doentes a Cuba para provar que aí as pessoas são melhor tratadas. Apontando o dedo, no seu estilo peculiar, a problemas provocados pelo subfinanciamento público e pela concorrência dos seguros privados, Moore acaba por concluir que o melhor é mesmo não adoecer. (CartazPúblico)

Depois de Bowling for Columbine e de Fahrenheit 9/11, Michael Moore põe novamente o dedo na ferida. "O que se passa connosco?" é a pergunta que, incessantemente, ele deixa no ar e que lança como mote de uma reflexão que os norteamericanos bem deveriam fazer.

Em Bowling for Columbine, demonstrava-se como é fácil a qualquer pessoa adquirir uma arma nos EUA - como naquela cena absolutamente surreal, em que um banco oferece armas a quem abra uma conta bancária em qualquer uma das suas agências! - e nas consequências óbvias de tal acto. É um filme impressionante, que reflecte sobre a escalada de violência naquele país, violência essa justificada e até alimentada por uma tradição de "salve-se quem puder".

No seu segundo documentário, Fahrenheit 9/11, Moore desmonta a, segundo ele, hipocrisia dos Estados, designadamente, apontando o dedo à família Bush e às suas estreitas relações com os Emiratos Árabes.

Ainda não vi Sicko mas será, certamente, a não perder.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

O início...

Nunca fui de escrever Diários. Nem em adolescente, quando estes eram companheiros frequentes e confidentes de muitas raparigas e rapazes. Não, comigo não. Não fazia o meu género, pensava.
Os blogues são, afinal, os novos Diários, para uns; forma de promoção, para outros. Vozes do que cada um pensa e pretende declarar aos outros. A todos. Para mim, sinceramente, é uma necessidade recente. Gosto de escrever e interesso-me por muitas coisas. Penso e sinto, como tantos. Nada de original, portanto. Devo ao meu Amigo L. o incentivo para avançar com esta experiência. O empurrão, o estímulo. Para ele, um enorme bem-haja.
Aqui vai. A ver vamos.