Saiu de um, ainda com os sons desvairados na cabeça, para correr para outro espectáculo. Que o primeiro tinha sido uma experiência absolutamente arrebatadora, que começava devagar para crescer, imparável, preso numa espiral sufocante, sempre redonda, sempre em círculo…
Assim, correu para a outra sala a pouca distância da primeira. Comprou o bilhete e correu, uma vez mais, para engolir o pão que lhe adormeceria a fome e lhe permitiria concentrar-se noutro som e noutras imagens, bem diversas das que enchiam a primeira sala rendida àquele som religiosamente alucinado.
Sentou-se e esperou. Sentou-se e apurou os sentidos. Sentou-se e deixou-se invadir pela voz de veludo que a abraçava, que tudo e todos envolvia, remexendo velhas músicas desta vez maquilhadas por uma orquestração que só lhes dava nova morada para o sentimento de sempre. Dá gosto, pensou. E pensou mais ainda. Pensou que estava perante a versão masculina da Diva, da Senhora do fado. Pensou também que, de certo modo, ela perpetuava-se não através de uma mulher, como esperado, mas sim pelo timbre grave e sério e seguro desta voz de homem que, timidamente, se apresentava perante a plateia que o aplaudia de pé, uma e outra vez.
Saiu para a noite quente, reconfortada. Saiu com um sorriso na boca e um som de qualidade na alma. Saiu para o abraço apertado que coroava esta noite quente cheia de música. Saiu…
(Outros comentários a este concerto em “Carta Branca a Camané”…)