quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Pelo olhar de Georges Dussaud...


A Assírio & Alvim editou Crónicas Portuguesas, do fotógrafo francês Georges Dussaud, que teve recentemente uma exposição com o mesmo nome, na Cadeia da Relação do Porto.
Fotografia a preto e branco, com o olhar das gentes e o sentimento de uma ruralidade que Dussaud tem vindo a captar desde os anos 80. Belíssimo!
Deixo aqui a ligação para um portfolio, com estes e outros olhares...


terça-feira, 27 de novembro de 2007

Os Gregos vistos por cá...


É comum dizer-se que a Grécia é o berço da civilização europeia. É, igualmente, comum a ideia de que a Europa é o resultado do desenvolvimento e evolução das cidades-Estado do mar Egeu. Tudo isto foi validado pelo conhecimento histórico de que dispomos.

Servem estas afirmações para introduzir a exposição que visitei nos últimos dias, na Gulbenkian: Os Gregos. Tesouros do Museu Benaki, Atenas.

Para a compreensão dos Gregos é necessário estar-se familiarizado com as suas ruínas e os seus lugares, os seus objectos, as suas formas de vida. Parte do espólio do Museu Benaki, agora em itinerância e que podemos apreciar na Gulbenkian, ajuda-nos a, de uma forma muito sintética, acompanharmos a evolução deste povo, através de exemplos escolhidos como significativos de cada um dos períodos históricos aqui focados, que cobrem cerca de oito mil anos de História. Com o apoio de textos que resumem cada uma das épocas tratadas, seguindo um friso cronológico que vai desde a Idade do Bronze até à independência face ao domínio turco, em 1821, passando pela Idade das Trevas, o Período Arcaico, a Época Clássica, a Helenística, a subjugação aos impérios romano, bizantino e otomano, esta exposição apresenta 157 peças de rara beleza, das quais aqui deixo uma pequeníssima amostra.

A não perder, no Museu da Fundação Calouste Gulbenkian, até ao próximo Dia de Reis.

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

"Que farei com este livro?"




Domingo à tarde. Perante a parca oferta cinematográfica, e a pedido de T., decido-me pelo teatro. A Companhia de Teatro de Almada leva à cena Que fazer com este livro?, de José Saramago e encenação de Joaquim Benite, numa segunda versão da peça, estreada em 1980.
Tendo como mote principal Camões e a publicação de Os Lusíadas, esta peça não se esgota na homenagem esperada. Mais do que fazer jus ao poeta e ao épico, pretende mostrar o século XVI e tudo o que estava em cena, à época: a megalomania de um rei imaturo; a complexidade e a tensão do jogo político e social que se travava em Portugal; a "anunciada" perda da independência nacional.
Camões vê aqui integralmente respeitada a sua dimensão humana. "Um homem de carne e de sentidos", disse ele falando de si próprio.

Saramago, ao escrever esta peça, não a fez com carácter biográfico. Antes se debruça sobre o papel do artista na sociedade: quem dele se serve, quem favoreceu ou contrariou a publicação da sua obra e a quem esta pôde beneficiar. É, pois, uma reflexão sobre jogos de poder.
A intemporalidade é uma nota dominante nesta peça. Torna-se visível de várias formas: a caracterização das personagens - Benite, o encenador, recorre à estratégia de não vestir todas as personagens à época e de recorrer a adereços actuais. Na verdade, só o texto segue uma construção mais aproximada ao português de seiscentos, o que imprime aos diálogos um ritmo próprio, poético e simbólico, de uma sonoridade única.
Que farei com este livro? sublinha a intemporalidade do tema fulcral - a liberdade -, também através da ponte que se estabelece entre o Portugal sebastianista e o do século XX, designadamente o do Estado Novo, através da repressão e da censura da Inquisição, por um lado, e, por exemplo, a das personagens fardadas de guardas republicanos de Salazar.
Paulo Matos como protagonista, à frente de um elenco de 20 actores, com um excelente desempenho; música de Carlos Paredes e texto de Saramago, absolutamente brilhante. No Teatro Municipal de Almada, até dia 21 de Dezembro próximo.

sábado, 24 de novembro de 2007

O eu fora de mim

Fotógrafo: Rui Bento Alves (http://olhares.aeiou.pt)


O dia em que o eu me deixou

foi um dia que não me é fácil recordar. em especial por causa do comportamento inesperado do eu nessa tarde terrível. já há alguns anos que não nos dávamos bem. andávamos sempre magoados um com o outro. mas nesse dia foi demais. o eu disse-me que já estava farto de todas as frases em que o colocava. quando pensava, quando escrevia, quando falava. obrigava-o a fazer o que ele não queria fazer de modo algum. por exemplo, projectar-se num ponto de vista que não era o dele. viver uma dor ou uma alegria que não eram as suas. isso, atirou-me ele à cara, dava à sua existência uma intensidade difícil de suportar. disse-lhe que não percebia o que é que ele queria dizer com isso. e ele continuou, exaltado: como é que é possível viver com a consciência de que sou uma forma a tentar comunicar? não me deixas tranquilo a teu lado. dizes que posso contar contigo, mas nunca sei como nem quando. abandonas-me ao fluxo contínuo da tua imaginação. transformas-me constantemente os desejos. eu queria uma vida mais sólida, com predicados definidos. um ponto de onde te avistasse sempre do mesmo ângulo. já não aguento mais viver contigo . esta foi a última frase que lhe ouvi antes de sair porta fora. não sabia o que pensar ou o que sentir nesse momento. ainda não sei. e é a primeira vez que falo disto sem chorar desde que o eu me deixou.
Manuel Portela

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Homenagem...

A Noite Passada - Sérgio Godinho

A noite passada acordei com o teu beijo
descias o Douro e eu fui esperar-te ao Tejo
vinhas numa barca que não vi passar
corri pela margem até à beira do mar
até que te vi num castelo de areia
cantavas "sou gaivota e fui sereia"
ri-me de ti "então porque não voas?"
e então tu olhaste
depois sorriste
abriste a janela e voaste

A noite passada fui passear no mar
a viola irmã cuidou de me arrastar
chegado ao mar alto abriu-se em dois o mundo
olhei para baixo dormias lá no fundo
faltou-me o pé senti que me afundava
por entre as algas teu cabelo boiava
a lua cheia escureceu nas águas
e então falámos
e então dissemos
aqui vivemos muitos anos

A noite passada um paredão ruiu
pela fresta aberta o meu peito fugiu
estavas do outro lado a tricotar janelas
vias-me em segredo ao debruçar-te nelas
cheguei-me a ti disse baixinho "olá",
toquei-te no ombro e a marca ficou lá
o sol inteiro caiu entre os montes
e então olhaste
depois sorriste
disseste "ainda bem que voltaste"

terça-feira, 20 de novembro de 2007

Para sempre, Paulo Autran

A 12 de Outubro deste ano, morreu Paulo Autran, considerado o maior actor brasileiro da actualidade.
Deixo aqui um registo da sua maneira única de dizer poesia, neste caso de um grande poeta brasileiro: Carlos Drummond de Andrade.

Poemas da minha vida - II

Poema Enjoadinho - Vinícius de Moraes



Filhos... Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem shampoo
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Piadongas...

João Paulo II recebeu Carolina Salgado. Bento XVI recebeu o casal McCann. É imperioso colocar um Securitas à porta do Vaticano.

Não resisti a partilhá-la. Só agora vi esta do Gato Fedorento!... Eu sei, já estou desactualizada, mas o que querem...

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Minha Pátria é minha Língua...

... e com ela a identidade colectiva de um povo.
Não, não sou Velho do Restelo; uma língua evolui, incorpora novos vocábulos, espelha novas realidades. É certo. Mas interrogo-me se será pelas boas razões que Portugal vai ceder - porque é de cedência que se trata - a alterar a sua escrita. É amplamente reconhecido que este Acordo tende a aproximar a nossa escrita da versão brasileira, apontando como razão de peso o facto do Brasil constituir um mercado muito mais vasto e que, portanto, urge captar.
Mas, seguindo o mesmo raciocínio, não será então de lembrar que o inglês falado no Reino Unido também diverge do inglês falado nos EUA e, apesar do mercado norte-americano também ser muito mais vasto do que o inglês, nem por isso os britânicos abdicaram da sua língua, nem se lançaram para um qualquer acordo ortográfico! Mantêm a sua identidade, bem como os norte-americanos mantêm a deles.
Trata-se, uma vez mais, de uma questão de atitude e de capacidade de afirmação.
A propósito desta questão, deixo aqui a notícia de imprensa sobre a posição da APEL e dos problemas que se perspectivam com a ratificação deste Acordo:
"Editores e livreiros exigem debate sobre acordo ortográfico
A Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, APEL, manifestou hoje «profunda preocupação» pelo recente anúncio oficial de que até ao final do ano será ratificado o Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico e exigiu que se realize «um debate sério» sobre a matéria.
Num comunicado à imprensa, a associação considera «precipitada e estranha a forma como este processo tem sido conduzido».
Lembrando os mais de 15 anos de «quase silêncio» decorridos desde a aprovação do Acordo Ortográfico, a APEL observa que a decisão de ratificar o Protocolo, anunciada recentemente pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, ocorre por «pressão» do Brasil e «sem qualquer discussão pública nem intervenção dos ministérios da Cultura e da Educação e da própria Assembleia da República».
O Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe assinaram este ano o Protocolo Modificativo, tendo sido os três primeiros países da CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa - a fazê-lo.
«É fundamental - declara a APEL - que todos os sectores da sociedade portuguesa, sem excepção, tenham consciência das implicações da eventual assinatura do Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico, quer a nível interno, quer a nível externo».
Na óptica da associação, não há, por um lado, «uma avaliação rigorosa do impacto que tal medida terá na Educação(...)» e, por outro, «numa altura em que Portugal beneficia do sucesso alcançado pelas editoras portuguesas em Angola e Moçambique, essa posição poderá ser posta em causa com a ratificação do Protocolo Modificativo do Acordo Ortográfico».
No caso concreto do impacto da medida na Educação, a APEL precisa que não é «apenas» o ensino da Língua Portuguesa que está em causa, na medida em que «toda a edição escolar e para-escolar, incluindo livros auxiliares de várias disciplinas, gramáticas e dicionários, terá de ser rapidamente actualizada».
Também a edição generalista e os catálogos das bibliotecas serão abrangidos, assim se «destruindo grande parte do esforço desenvolvido pela iniciativa do Plano Nacional de Leitura», adverte o comunicado.
Posição semelhante à da APEL foi tornada pública pela Sociedade Portuguesa de Autores, SPA, que contesta a ratificação do Protocolo sem o «indispensável debate público e institucional sobre a matéria».
Diário Digital / Lusa

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Mariza - Chuva

Mariza - Chuva
Jorge Fernando

As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembranças que doem
Ou fazem sorrir

Há gente que fica na história
da história da gente
e outras de quem nem o nome
lembramos ouvir

São emoções que dão vida
à saudade que trago
Aquelas que tive contigo
e acabei por perder

Há dias que marcam a alma
e a vida da gente
e aquele em que tu me deixaste
não posso esquecer

A chuva molhava-me o rosto
Gelado e cansado
As ruas que a cidade tinha
Já eu percorrera

Ai... meu choro de moça perdida
gritava à cidade
que o fogo do amor sob chuva
há instantes morrera

A chuva ouviu e calou
meu segredo à cidade
E eis que ela bate no vidro
Trazendo a saudade

Lura - Na Ri Na (live)

Em memória a uma viagem a Cabo Verde!

terça-feira, 13 de novembro de 2007

De costas para os outros ou a antítese da urbe

De há uns anos para cá, Portugal tem vindo a aplicar modelos estranhos, geradores de comportamentos igualmente estranhos. São disso exemplo os condomínios fechados e os centros comerciais.
Em ambos os casos, são modelos que contrariam o conceito de urbe, de comunidade, de conjunto, de integração. Por razões que me parecem meramente especulativas, gananciosas, as nossas cidades têm vindo a albergar guetos, que apenas funcionam intramuros e que em nada contribuem para o desenvolvimento sustentado das cidades.
Muito se tem atacado (e bem) os centros comercais, por destruirem o comércio tradicional e por retirarem vida à cidade. Mas esquecemo-nos, por vezes, destes guetos que são os condomínios fechados. É neles que se têm vindo a criar infraestruturas de qualidade, como os espaços verdes, as áreas de lazer, o comércio mais cuidado, a segurança. Contudo, estes núcleos de habitabilidade supostamente privilegiada estão a contribuir para que as cidades percam vida própria, esmoreçam, se acinzentem.
Viver numa redoma, porquê? Será que Portugal é um país com um nível de delinquência tal que empurre os seus cidadãos para dentro destas incubadoras, única possibilidade de sobrevivência? Ou será que é uma pretensão de ascensão social, de diferenciamento, de delimitação do território, de alergia ao próximo?
Seja como for, a criação ou, melhor dizendo, a proliferação destes espaços contraria o conceito de urbanismo: uma cidade planificada, com conforto e bem-estar. À escala humana - solidária.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Poemas da minha vida - I

SONETO DA FIDELIDADE

De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei-de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor que tive
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

Vinícius de Moraes

domingo, 11 de novembro de 2007

Ler devagar... a oriente

Uma amiga falou-me, entusiasticamente, da nova Ler Devagar, na Fábrica de Braço de Prata, na zona oriental de Lisboa. Fiquei curiosa. Fui espreitar.
Deparei-me com uma livraria - ou devo antes dizer, um espaço multiusos - constituído por 12 salas e 3 ateliês, instalada na antiga fábrica de material de guerra, edifício do início do séc. XX. É um espaço aberto a todas as formas de arte, onde se pode ler, relaxar, jantar, ouvir música, assistir a concertos, exposições, lançamentos de livros, ver filmes... enfim, onde até existe uma sala de comércio justo, para venda de roupas e artigos em segunda mão.
Mas o que me encantou particularmente - para além de tudo o que já disse -, foi saber que tem uma Comunidade de Leitores que, duas vezes por mês, propicia debates sobre um livro ou um filme.
Espaço multifacetado, onde a ideia é estar, permanecer, usufruir, degustar até. Para toda a família, a partir das 18h, dias úteis, e 14h aos fins-de-semana. Até às tantas.

sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Da autoria...

Ontem à noite, num seminário dedicado às questões da Tradução, o debate girava em torno da dignificação da actividade de tradutor ou, melhor dizendo, do reconhecimento do tradutor enquanto autor de uma obra. A ideia-chave consiste em que a versão traduzida não reflecte apenas a mudança da língua, mas, sobretudo, intrerpreta o original, reescrevendo a obra para uma língua e uma realidade que não a primeira em que foi escrita - o que envolve o tradutor na autoria do livro.
A este propósito passo a transcrever o excerto de A Solidão Reinventada, de Paul Auster, com tradução de Ana Luísa Faria:
"O Livro da Memória. Livro Nono.
Durante a maior parte da sua vida adulta, ganhou a vida traduzindo livros de outros escritores. Senta-se à secretária a ler o livro em francês, e depois pega na caneta e escreve o mesmo livro em inglês. É o mesmo livro e ao mesmo tempo não é o mesmo livro, e a estranheza desta actividade nunca deixou de o impressionar. Cada livro é uma imagem de solidão. É um objecto tangível que se pode agarrar, poisar, abrir e fechar, e as suas palavras representam muitos meses, senão muitos anos, da solidão de um homem, de forma que a cada palavra lida num livro poderíamos dizer para connosco que nos confrontamos com uma partícula dessa solidão. Um homem sentado num quarto a escrever. Quer o livro fale de solidão, quer de companheirismo, é necessariamente fruto da solidão. A. senta-se no seu quarto para traduzir o livro de outra pessoa, e é como se sentasse na solidão dessa pessoa e a fizesse sua. Mas está claro que isso é impossível. Porque uma vez quebrada, uma vez assumida por outrem, a solidão deixa de ser solidão, para se tornar uma espécie de companheirismo. Ainda que só esteja uma pessoa no quarto, estão lá duas. A. imagina-se como uma espécie de fantasma dessa outra pessoa, que ao mesmo tempo está e não está ali, e cujo livro é e ao mesmo tempo não é o mesmo que ele vai traduzindo. É, pois, possível, diz para consigo, estar e não estar simultaneamente sózinho.
Uma palavra transforma-se noutra palavra, uma coisa transforma-se noutra coisa. Trabalha assim, diz para consigo, do mesmo modo que trabalha a memória. Imagina dentro de si uma imensa Babel. Há um texto, e o texto traduz-se num número infinito de línguas. As frases jorram de dentro dele à velocidade do pensamento, e cada palavra pertence a um idioma diferente, mil línguas que ao mesmo tempo clamam dentro dele, e cujo alarido ressoa através de um labirinto de quartos, corredores e escadarias, com centenas e centenas de andares. Repete uma vez mais. No espaço da memória, tudo é ao mesmo tempo aquilo que é e outra coisa. E ocorre-lhe então que tudo o que está a tentar registar no Livro da Memória, tudo o que até agora escreveu, não é mais que a tradução de um instante ou dois da sua vida - esses instantes que viveu na véspera de Natal de 1979, no seu quarto de Varick Street."
Paul Auster, A Solidão Reinventada, trad. Ana luísa Faria, Venda Nova, Bertrand Editora, 1994, pp. 188-189.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Semana Cultural do Intervalo

Foi em 1969, em Algés, que um grupo de pessoas querendo mostrar que o teatro e a cultura podiam ser o entendimento das coisas, das gentes e da vida, fundaram o 1º Acto Clube de Teatro, sucedendo hoje O Intervalo, não apenas como herdeiro, mas como sendo, de facto, um prolongamento. (Roteiro 30 dias - Oeiras, nº 127 )

Já foi no mês passado, concretamente na semana de 8 a 14 de Outubro, que me deliciei assistindo à já tradicional Semana Cultural deste Grupo de Teatro, que funciona no Auditório Municipal Loudes Norberto, em Linda-a-Velha, e que, a pretexto da comemoração do seu 38º aniversário, proporciona a todos quantos estejam interessados, momentos de festa. Assim, lá actuaram Camané, António Victorino d'Almeida, Sérgio Godinho, Paulo de Carvalho, Agir, Mafalda Sachetti, Fernando Tordo, Rão Kyao e António Maria Cartaxo, num périplo que foi desde o fado até à música clássica. Paralelamente, intervieram: Morais e Castro, Cármen Dolores, Luis Aleluia, Maria do Céu Guerra, Hélder Costa, Correia da Fonseca, Raúl Calado (em homenagem a José Duarte), Baptista Bastos e António Cartaxo.

Para encerrar a Semana, duas peças da Companhia da casa: O Barbeiro de Sevilha e Torga.

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

O regresso de Michael Moore



Michael Moore volta à carga e coloca, novamente, os Estados Unidos no banco dos réus. Em Sicko, o mote é o débil sistema de saúde norte-americano, que o realizador compara com o de outros países, chegando mesmo a levar doentes a Cuba para provar que aí as pessoas são melhor tratadas. Apontando o dedo, no seu estilo peculiar, a problemas provocados pelo subfinanciamento público e pela concorrência dos seguros privados, Moore acaba por concluir que o melhor é mesmo não adoecer. (CartazPúblico)

Depois de Bowling for Columbine e de Fahrenheit 9/11, Michael Moore põe novamente o dedo na ferida. "O que se passa connosco?" é a pergunta que, incessantemente, ele deixa no ar e que lança como mote de uma reflexão que os norteamericanos bem deveriam fazer.

Em Bowling for Columbine, demonstrava-se como é fácil a qualquer pessoa adquirir uma arma nos EUA - como naquela cena absolutamente surreal, em que um banco oferece armas a quem abra uma conta bancária em qualquer uma das suas agências! - e nas consequências óbvias de tal acto. É um filme impressionante, que reflecte sobre a escalada de violência naquele país, violência essa justificada e até alimentada por uma tradição de "salve-se quem puder".

No seu segundo documentário, Fahrenheit 9/11, Moore desmonta a, segundo ele, hipocrisia dos Estados, designadamente, apontando o dedo à família Bush e às suas estreitas relações com os Emiratos Árabes.

Ainda não vi Sicko mas será, certamente, a não perder.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

O início...

Nunca fui de escrever Diários. Nem em adolescente, quando estes eram companheiros frequentes e confidentes de muitas raparigas e rapazes. Não, comigo não. Não fazia o meu género, pensava.
Os blogues são, afinal, os novos Diários, para uns; forma de promoção, para outros. Vozes do que cada um pensa e pretende declarar aos outros. A todos. Para mim, sinceramente, é uma necessidade recente. Gosto de escrever e interesso-me por muitas coisas. Penso e sinto, como tantos. Nada de original, portanto. Devo ao meu Amigo L. o incentivo para avançar com esta experiência. O empurrão, o estímulo. Para ele, um enorme bem-haja.
Aqui vai. A ver vamos.