terça-feira, 1 de julho de 2008

O elo quebrado...

"Não quero morrer católica!" Esta afirmação é de Julia Antón, 77 anos, espanhola. Ela é eco das aspirações de alguns católicos, por baptismo, que querem renegar, de forma oficial e reconhecida publicamente, a sua integração na comunidade dos crentes.

Esta notícia colhi-a num dos últimos números de Le Nouvel Observateur. Insólita pela novidade. Segundo o artigo do periódico, a "cidade dos apóstatas" [aqueles que renunciam a uma religião, que abjuram da fé] ganhou forma em Rivas Vaciamadrid, um município dos arredores da capital espanhola.

Da mesma forma que o baptismo é o rito de entrada na comunidade dos crentes católicos, dando lugar a um "certificado" de baptismo, estes católicos forçados reivindicam o direito de saída dessa comunidade através de outro rito semelhante, com certificado de "fim de história". Não se identificam com a Igreja Católica, a qual, juntamente com a Guardia Civil, responsabilizam pelos males nacionais. Gente que sente o fardo de um passado de alguma forma traumático e que reclama uma maior amplitude dos direitos e liberdades individuais.

Numa Espanha tida por católica mas em que se têm vindo a operar mudanças, esta pode ser mais uma acha para a fogueira, na senda das últimas transformações introduzidas por Zapatero: casamento homossexual, divórcio expresso, abolição do ensino religioso durante o horário escolar, debate sobre a liberalização do aborto, a reforma do financiamento da Igreja...

A apostasia poderá ser mais um contributo para a tão reclamada liberdade religiosa? Deixo a questão em aberto.

16 comentários:

AGRY disse...

Seria mais sensato afirmar que não desejaria morrer virgem? Provavelmente ,rss!
A libertação das garras tentaculares duma Igreja ultraconservadora, estática que nada questiona porque receia a sua própria sombra projectada nas noites gélidas do franquismo será uma espécie de sub-reacção que os psicanalistas poderão dissecar
Tenha uma óptima semana

Unknown disse...

A mim faz-me uma certa espécie a necessidade que as pessoas têm de "sair" de qualquer coisa em que não acreditam. Se não acreditam na igreja e no baptismo, então o acto em si não teve significado nenhum. Para quê então querer sair?

Só é católico quem quer, quem sente, quem tem fé (falamos de católicos como poderia ser de uma qualquer outra religião). Não é o acto do baptismo que torna alguém católico e por isso não percebo como se diz que não se quer morrrer católica.

Beijos

Paula Crespo disse...

Agry,
Bem visto...;)
Acha então que se trata de um caso de divâ?? É um ponto de vista interessante... ;)
Bom fim-de-semana!

Paula Crespo disse...

Ka,
Claro que sim. Mas, pelo que percebi do artigo, é mais uma tomada de posição por parte destas pessoas. Uma espécie de pôr os pontos nos iis. Ou seja, já que a Igreja prevê uma porta de entrada na comunidade católica, e, sem isso, é a própria Igreja que não reconhece ninguém como seu filho se não estiver baptizado, então eles vêm reclamar uma porta de saída, percebes? Acho que é isto...
Bjs

Paula Crespo disse...

LB,
Eu faço uma leitura um pouco diferente da sua. Pelo que entendi do artigo, que me apanhou completamente desprevenida, pois nem sabia que isto existia, não se trata de reconhecer ou não legitimidade à Igreja enquanto instituição. Isso parece-me evidente e nada tem a ver com o facto de a ela aderirmos ou não. Por exemplo, eu reconheço a existência institucionalmente falando de uma organização qualquer, o que não significa que vá aderir a ela. Penso que aqui a questão está mais em termos formais, por assim dizer. Ou seja, a Igreja só reconhece como seus membros as pessoas que nela entraram, pelo baptismo (que é a única forma reconhecida). Ora, como estas pessoas foram baptizadas em criança, sem voto na matéria, são formalmente católicas. Mas, por outro lado, como rejeitam pertencer a esta comunidade, e seguindo a mesma lógica de raciocínio da mesma, então teriam que ter uma porta de saída. Entende?...
É interessante isto...
Bjos

Paula Crespo disse...

LB,
Creio que se trata de um preciosismo por parte dela e do grupo de pessoas que reivindicam tal (sim, há mais gente...). Mas, ao contrário do exemplo que deu, dos partidos políticos ou grupos associativos, numa religião a coisa é um bocadinho diferente. No primeiro caso, se você deixar de pagar quotas acaba-se o vínculo. Numa religião entra-se para toda a vida. A menos que se seja excomungado (nem sei se isso continua ou não a existir na religião católica). Mas eu não estou aqui a fazer o papel de advogada do grupo em causa - nem de defesa, nem de acusação ;) Apenas acho a questão interessante, é só :)
Bjos

Luis Eme disse...

acho que no campo religioso, os elos quebram-se com o que se sente e com o se pensa das religiões.

entre nós, normalmente, os baptizados realizam-se nos primeiros anos de vida, sem sequer termos possibilidade de sermos ouvidos ou achados, pelo que considero este elo nulo, Paula...

Paula Crespo disse...

LB,
Andamos em círculo...
Para mim, isto é uma tomada de posição. E penso que temos de ter em conta também a geração que reivindica isto, donde ela veio, etc. Estamos a falar de pessoas que viveram de perto a Guerra Civil espanhola e isto talvez não seja por acaso... Penso que são pessoas que levam muito a sério estas questões, que as tomam como princípio.
Quanto aos vínculos, também tem que se lhe diga... depende da sua natureza. Nem sempre as coisas são assim tão fáceis, pois não?
Bjo

Paula Crespo disse...

Luis Eme,
Claro que sim, Luís. Mas isso é para nós que encaramos estas questões de uma forma menos dogmática, ou que estas questões não nos magoam ou não estamos traumatizados por elas...
Poderá haver outros enquadramentos, é só isso.
Bom fim-de-semana!

BlueVelvet disse...

Olá Paula,
interessante esta questão, mas do meu ponto de vista, a discussão em si, é espúria.
É óbvio, e aliás a própria religião católica o reconhece, a negação da Fé ou o não cumprimento dos Mandamentos da Igreja, retira automaticamente qualquer efeito ao baptismo.
E mais, há dois tipos de baptismo: o infantil e o adulto.
No caso do infantil, é como que uma apresentação da criança a Deus ( para quem acredita), mas será a criança logo no Crisma ou Confirmação que já é feita quando são adolescentes e depois ao longo da sua vida, através do seu comportamento, que se mantém Católica ou não.
Portanto, esta senhora tem o seu problema resolvido: não quer morrer católica não morre.
Cá para mim, esta gente adora dar nas vistas.
Se não sabem como, inventam.
Desculpe, não tem a ver com o seu post, que é bem pertinente, mas com o tempo que certas pessoas ( como esta senhora)perdem a discutir o sexo dos anjos, quando há tanta coisa tão grave e importante que se passa no mundo e deveria ser dicutida e não o é.
Desculpe mais uma vez, mas é que me dá uma raiva.
É como as paradas gays...
Falta-me a paciência.
Beijinhos e bom domingo

Paula Crespo disse...

Bluevelvet,
Recordo que eu comecei por dizer neste post que a questão era "insólita". Eu nunca me teria lembrado de tal!...;) Mas o que para a maioria não suscita problema, para alguns constitui incómodo, que é o caso destas pessoas. Parece-me uma questão conceptual. Faz-nos falta a opinião de um sacerdote, para nos esclarecer sobre a posição da Igreja (e não a nossa, que já aqui ficou dito qual é) quanto à vigência ou não do baptismo para toda a vida.
Seja lá como for, a discussão é engraçada e é para isso que os blogues servem, não?... :)
Bjs e uma boa semana!

Luís Galego disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Luís Galego disse...

Insólita pela novidade.

Concordo com a resposta que dás à Ka...Parece-me que os ventos que sopram por terras de Espanha estão a permitir uma série de debates acerca de tabús que se econtravam escondidos nos baús das consciências. Sem ter uma opinião definitiva sobre o assunto, parece-me matéria pertinente e digna de ser debatida.

Bjs

Paula Crespo disse...

Luis Galego,
Sim, os ventos sopram por terras de Espanha e, pelo menos, trazem o debate. E é também o debate que me moveu ao divulgar esta notícia. Porque insólita, de facto.
Bjs e bom fim-de-semana!

Anónimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Paula Crespo disse...

Filomeno,
Bem, comparando com outras, principalmente com outras seitas religiosas, acredito que sim...;)
mas não deixa de ser uma questão cultural: estamos envolvidos nela, culturalmente, para o bem e para o mal. É inevitável...