quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

A ver navios...



No terraço, num tempo dividido entre o café e o cigarro, partilhavam-se saídas. Saídas longas, traduzidas em viagens de Verão, com muito sol, daquelas alimentadas o ano inteiro para se esgotarem numa semana ou duas de glória.


Estás a ver aquele paquete? Já viajei num deles. Fantástico, adorei!, gabava-se justamente um, invocando as suas memórias de dias felizes, a bordo e na companhia dos seus. Aquilo é que é vida!, continuava. Ora, nada melhor do que partir com uma mochila às costas, dizia outra. Virei-me e, involuntariamente, franzi o sobrolho, desacreditado: justamente aquela que nada nem ninguém previa que tivesse esse tipo de memórias, de experiências. A resmungona crónica, sempre sombria, sempre a protestar por tudo e por coisa nenhuma. Quem diria!, pensei. Não era fácil imaginá-la assim, gaiata e ligeira, a carregar uma mochila às costas por um qualquer monte europeu, gozando dos prazeres da descoberta. Sendo feliz, em suma.


E a conversa continuava, livre e leve. E mais isto e mais aquilo e mais outra experiência. Conheces…? Ah sim, já lá estive… E foste…? Por acaso aí não cheguei, mas vi o…e a…


Passados poucos dias outro paquete desfilava no rio e outra conversa surgia, a propósito. As memórias de viagens abrem-nos sempre o sorriso e desenham no nosso espírito pensamentos coloridos, dos tais que pintam os dias de Inverno. Que nós por cá não nos podemos queixar muito, que nesta cidade, cheia da claridade reflectida neste rio lindo, os dias cor de cinza quase se contam pelos dedos. E quando chegam enchem-nos de birra, ficamos sem disposição para nada a não ser suspirar pelo sol e pedir contas a S. Pedro por tamanho castigo. E aí, voltamo-nos para o rio a olhar os navios ou abrimos a agenda grande para percorrer o mapa, que o “vá pelos seus dedos” é a opção mais à mão…

13 comentários:

Vera disse...

É bom parar e ver navios. deve ser bom parar, ver navios e lembrar por onde se passou! Gostei do Conto :-)

Flip disse...

Paula
um título sugestivo, uma prosa excelente...mas é óptimo vadiar, se é...
:-)

CPrice disse...

"E a conversa continuava, livre e leve."
tal qual esta tua Paula .. nunca o "ver navios" se revestiu de um conteúdo tão grato :))

Beijinho *

Paula Crespo disse...

Vekiki,
Lembrar por onde se passou faz também parte da viagem. É como o "antes", a preparação da mesma; o antes e o depois amparam o "durante"... ;)
Agradecida... :)
Bjs

Paula Crespo disse...

Flip,
Utilizemos o imperativo e "Vadiemos, então!". Porque é imperioso... ;)

Paula Crespo disse...

Once,
A metáfora aqui é partilhada pelo significado real da coisa: olhando os ditos e sonhando, com resultados concretos ou... ficando a ver navios... ;);)
Bjs

PB disse...

Excelente texto, Paula. Parabéns!
Beijinhos

Paula Crespo disse...

Pedro,
Obrigada... :)
Bjs

Paula Crespo disse...

LB,
Pega-se? Hum, não sei... ;)
Agradecida... :)
Bjo

mariam [Maria Martins] disse...

Paula,

neste invernal dia... este post soube mesmo bem!

este quadro, fez-me recordar belos e únicos momentos que passei em certo dia neste último verão, no 'Raínha Sofia'... ali fiquei parada frente ao seu original por largos minutos, em silêncio e de sorriso no rosto. (outros quadros me deram um alvoroço de sentimentos também).

obrigada.

sorrisos :)
mariam

BlueVelvet disse...

Excelente texto.
Também eu que já viajei meio-mundo e fiz vários cruzeiros, dou por mim muitas vezes a " ver navios"
Bjs

Paula Crespo disse...

Mariam,
:)
A pintura proporciona-nos momentos de "alvoroço"... o que é bom! é sinal de que comunica connosco... :)
Bjs

Paula Crespo disse...

Blue,
Ver navios ou uma das múltiplas formas do sonho...
Bjs